domingo, janeiro 29, 2006

Um labirinto de links pra compensar os posts atrasados

Em primeiro lugar, desculpa! Fiquei esses dias todos sem postar pois estava sem computador e, depois, sem energia. Não elétrica. Energia pra escrever no blog, mesmo. Em outras palavras, preguiça!

Mas, enfim, adepto do ócio criativo, aproveitei esse tempo pra assistir uma porção de filmes e, assim, achar uma porção de assuntos pra discutir aqui no Cabruuum!!!!! Eis o primeiro:

Ontem à noite assisti Sin City. O filme lembra as obras do Quentin Tarantino, o cineasta que fez Pulp Fiction e Kill Bill, só pra dar umas referências. Não é à toa a semelhança: o Tarantino participou da feitura de Sin City, ao lado do diretor Robert Rodriguez e do autor da obra que originou o filme, o quadrinista Frank Miller.



[a capa do livro]

Bem, não vou entrar em detalhes . Aqui tem um link pro site Azul Calcinha, que já tem isso prontinho. Ah, se sobrar um tempo, depois de ler a resenha de Sin City, visite a seção de HQs do site. Além de ter um belo nome, o site também tem conteúdo!

Bem, voltando ao filme. Desde já, mesmo com vergonha na cara, digo que não li as histórias em quadrinhos. Que diabos está fazendo esse louco aqui, então, querendo falar sobre Sin City?, você pode reclamar. Bem, jornalisticamente e como na cena da morte do Jackie Boy, personagem do filme e da HQ, saio pela culatra e boto alguém pra falar por mim.

Quem?

Luciana de Almeida Pereira Jordão, mestre em Artes – ênfase em Imagem e Som - pela UFMG, e Mônica Fontana, doutoranda em Letras pela UFPE. As duas escreveram o artigo
O Pecado de Sin City - Adaptação dos Quadrinhos para o Cinema, apresentado no XXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação (Rio de Janeiro, setembro de 2005).

Veja um trecho do texto:

"(...) alguns filmes se apropriam dos personagens de HQ sem, no entanto, propor uma aproximação de linguagens. Este é o caso de Homem-Aranha (2002), blockbuster recordista em bilheteria que empregou a narrativa cinematográfica clássica, ampliada por efeitos especiais de última geração, para criar uma verossimilhança sem precedentes. Assim, ao fazer Peter Parker voar pelos céus de Nova Iorque lançando suas teias, sem recursos narrativos que se interpusessem entre o meio e o espectador, o filme criou um efeito de máxima catarse, o que afeta diretamente o público de cinema, muito maior que aquele aficionado em quadrinhos e cultura pop em geral. Cumprem-se assim as estratégias mercadológicas do cinema industrial, cujos objetivos e compromissos financeiros estão acima dos artísticos.

Esta, no entanto, não é a estratégia de todas as adaptações de HQ, e Sin City (2005) optou por incorporar a metalinguagem à sua narrativa para remeter o espectador diretamente ao universo dos livros de Miller. Tal escolha cria uma interposição entre a obra e seu público, o que confere ao filme um menor potencial de bilheteria do que o citado Homem-Aranha e um perfil de independente, reforçado pela escolha de Robert Rodriguez como co-diretor."

E mais este trecho, pra quem manja do linguajar:

"(...) uma das principais interseções de fidelidade entre os dois meios é o uso da silhueta. Em diversos momentos a computação gráfica altera a fotografia de forma a transportar as imagens impressas nos livros para a tela, literalmente. Isto é reforçado por enquadramentos, figurino e postura dos atores, mas como o meio fílmico tem suas peculiaridades, se torna mais óbvio quando a cena é silhuetada. Como na HQ, na cena em que o coiote devora Kevin, sendo assistido pelo impassível Marv a fumar um cigarro, o que se vê são os contornos brancos dos personagens sobre um fundo escuro. Dramaticamente esta é uma solução que ameniza a violência da ação.




[a tal cena]

Este recurso ressurge ao longo do filme, inclusive para destacar elementos menos visíveis, mas que remetem o espectador ao desenho original. É desta forma que os colares e brincos de Becky são evidenciados, numa conexão com o desenho de Miller, onde os adereços estão em contraste com o apagamento de seu rosto, coberto pela sombra de um negrume absoluto. Esta é a apresentação da personagem que irá trair as companheiras deixando o domínio de Old Town em perigo."

Segue o baile do ctrl C + ctrl V:

"Enquanto a estética atinge neste aspecto a fidelidade à HQ, na montagem, o ritmo é perdido. Através da superposição de quadros e da irregularidade de tamanho, formato e posição na página, a graphic novel alcança uma cadência entrecortada e ágil. Traduzir para imagens em movimento seria criar uma edição dinâmica de planos curtos e rápidos. Porém, Rodriguez e Miller optam por planos longos desacelerados pelos movimentos de câmera que demandam tempo para se completar. Isto contradiz a citada afirmação encontrada no site oficial de que a adaptação não apresentaria nenhuma perda neste sentido."

E, ufa!, pra terminar:

"A versão cinematográfica promove ainda uma alteração estrutural na direção de arte que é a inclusão de cores para destacar certos elementos da imagem. Na seqüência de Marv e Goldie, a cama é vermelha, enfatizando o sentimento de paixão, e Goldie tem os cabelos loiros, numa conexão direta com seu nome. Ao longo do filme surgem olhos, lábios, carros e luzes coloridas que se destacam na fotografia P&B. Como era de se esperar, já que se trata de uma história passada na violenta Basin City, há sangue escorrendo praticamente o tempo todo. E é sobre esse elemento que a cor exerce um papel fundamental de ampliação dramática. Em algumas cenas o sangue jorra em P&B, mas em outras, como no momento em que Marv mata dois homens nos fundos do Kadie´s, ele é silhuetado ao ser recortado em branco. Há um forte contraste do branco em oposição à escuridão do beco sujo onde a ação transcorre. Mas é com o auxílio da cor que a ênfase fica mais evidente. Em That Yellow Bastard, quando Hartigan e Nancy perseguem Roark Jr. até a fazenda, acontece um acidente, e nos destroços, o herói percebe que tem sangue em suas mãos. Este indício confirma que seu opositor havia escapado, mas ferido, pois o líquido gosmento de repulsivo cheiro de carne podre, é amarelo. Tal opção estética cria maior intensidade dramática ao filme, mas representa uma ruptura com a proposta da série em quadrinhos."


[exemplo da adaptação. Em cima, quadro do quadrinho Sin City. Embaixo, a mesma cena, no filme]


As autoras não encerram o artigo com chave de ouro. O que, no fim, é até melhor. Pois a porta é pra ficar aberta mesma, pra entrarem os debates. Olha só, que legal, portanto:

"Este posicionamento inflexível não se sustenta diante da inesgotável discussão sobre a impossibilidade de conformação completa de uma linguagem a partir de outra, já que cada uma delas possui suas especificidades intrínsecas. Na verdade, questiona-se a pretensa busca por esta transposição integral que partiu da própria produção, ao afirmar que os elementos narrativos da HQ Sin City foram “pasted of” para as telas do cinema. As lacunas verificadas nesta adaptação não invalidam suas qualidades como obra autônoma, que levou ao limite o diálogo com os quadrinhos."

Bem, o artigo é grande, teria mais coisas pra trazer até aqui. Mas você tem o e-mail das autoras lá em cima, é só cutucar com o mouse sobre o nome delas e iniciar uma discussão.

Bom. É isso. Boas leituras, assistidas e cutucões no mouse!

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