segunda-feira, maio 26, 2008

Torres trigêmeas 2

Geralmente evito de comentar o porquê de eu achar geniais alguns trabalhos que publico aqui. O motivo é simples: se é genial, é também óbvio. E se eu explico o trabalho, parece que estou duvidando da sua perspicácia, leitor. Em todo caso, percebo que nem sempre se chega aonde se quer chegar, e uma visão de genialidade pode ser muito diferente da(s) outra(s).

Em outras palavras, registrar a maneira como eu enxergo genialidade no cartum do Santiago, publicado no post anterior, pode não só servir de caminho para uma leitura mais embasada, mas também estimular alguns leitores a dizer: "ah, eu tinha interpretado de outro modo. No meu ponto de vista, isso quer dizer que..."

Por isso digo agora que esse trabalho do Santiago me chama a atenção porque realoca uma idéia bastante conhecida da ilusão de ótica, que é essa questão das duas barras que parecem três, ou vice-versa. Quer dizer, a idéia, por si só, é bastante conhecida, e o princípio que a norteia é aplicável em vários casos, como este das patas do elefante (o link remente a outras ilusões de óticas igualmente interessantes. Vale a pena explorá-las, embora não sejam da mesma natureza do problema das barras). Ou seja, por si só, a ilusão de ótica no cartum do Santiago não justifica a genialidade. O que a justifica, na verdade, é a reapropriação do já conhecido, o uso disso dentro de um contexto histórico, numa ótica que ninguém antes mexeu. No caso, o "11 de setembro".

É o que me motiva a olhar o trabalho do Santiago e dizer: "bah, que sacada!".

domingo, maio 25, 2008

Torres trigêmeas

O cartunista Santiago foi premiado com o 3º lugar na categoria Cartum do 19º Salão Carioca de Humor. A lista completa dos premiados você acompanha aqui! O curioso é pensar como devem ter sido os dois trabalhos considerados melhores que o do Santiago.

Por quê? Bem, veja com os próprios olhos. O título da obra é "Torres trigêmeas". Para superá-lo, devem ter sido trabalhos espetaculares.


quarta-feira, maio 21, 2008

É racismo?

A discussão sobre ser ou não racismo o fato que origina o humor nesta tira da Turma da Mônica é longa e incerta. Eu tenho minhas dúvidas, pendendo para ambos os lados. Enfim, cutuque no link acima que você vê também os lados da discussão.

terça-feira, maio 20, 2008

Breve psicologia da colaboração e do colaborador, amparada nos quadrinhos

Refletia eu, numa dessas reflexões estranhas que nos surgem embaixo do chuveiro, sobre por que é tão satisfatório e compensador ter seu texto publicado em outro blog ou, vice-versamente, publicar um texto alheio no seu próprio blog. Me questionei sobre isso em função do contentamento de ter publicado o texto do Ben-Hur no último post, mas também baseado em outras colaborações.

Bem, de repente me ocorreu que é uma sensação semelhante a que eu tinha quando era piá e pegava alguma edição especial de gibis envolvendo duas personagens importantes dos quadrinhos de super-heróis que raramente se encontravam. Exemplo: Homem-Aranha & Batman (mais raro ainda, porque envolve duas editoras diferentes). Aquilo me dava uma alegria, uma curiosidade, um sentimento de encontro apesar das diferenças, de colaboração, união...

Enfim, uma reflexão barata, mas que realmente faz sentido. Não que um colaborador de blogs se sinta um super-herói, claro. Mas sim porque os gibis com super-heróis repentinamente se encontrando carregavam dentro de si, implicitamente, uma idéia de colaboração, união, respeito ao diferente.

Talvez seja isso.

segunda-feira, maio 19, 2008

Inodoro, com muito (bom) gosto

Publico hoje neste humilde blog, com muito orgulho, uma excelente colaboração do jornalista Ben-Hur Demeneck. Ben-Hur conta aqui como tomou conhecimento de Inodoro Pereyra, personagem do cartunista argentino Fantarrosa. Quase todos os links do texto são fornecidos pelo Ben-Hur. As imagens, todas são.

Nos próximos dias publico aqui a segunda parte do texto, falando especificamente sobre Fontanarrosa.

Bem, deleite-se!

***

Como conheci Inodoro Pereyra
por Ben-Hur Demeneck

Era um pacote fechado de um sebo. Encontrado em uma loja de livros, em Itajaí, SC. Parecia uma miragem em um posto da gasolina. Depois de desatado o laço que envolvia quatro volumes de "Ediciones del Flor", topei com desenhos de Inodoro Pereyra, el renagaú. Nome completo e alcunha do personagem de Fontanarrosa. Em poucas semanas se aboletou na minha memória e não saiu mais. Ficou amigo de muito tempo.

Ignorava o personagem até então. Me senti assistindo a uma luta extraordinária de homens musculosos vestindo luvas estofadas e bermudas de nylon. E descubro o nome do mais carismático deles. Fico então doido de curiosidade para saber quem seria esse tal Mohammed Ali. Foi essa a sensação de trombar com o enorme culto ao nome Fontanarrosa. Palavra um tanto inconveniente para qualificar um humorista nato, que viveu de desancar a solenidade de tudo com sua inteligência. Natural de Rosário, Argentina, esse cartunista completaria 64 anos neste 2008 se estivesse vivo (informações complementares no sobre o autor no post em outro post, ainda a ser publicado). Faleceu em julho passado deixando uma obra imperdível.





O gaúcho que não atravessou a fronteira

O personagem Inodoro não circula em português, está inédito no Brasil. Ficou pelo seu rancho no interior argentino, mateando. Já o seu criador, veio ao público brasileiro com "Boogie, o Seboso" ("Boogie, El Aceitoso"), que na imagem acima está à esquerda da tela. Um personagem que explora a banalização da violência. A editora L&PM esclareceu via e-mail para o blog cabruuum [gentileza do Ben-Hur: pois o esclarecimento foi para ele mesmo, que no texto citou este humilde blog por profissionalismo] que “não há previsão de reedição deste livro ou de outros livros do autor”. Está esgotado e assim permanece o ISBN 85.254.0199-4. Inodoro, então, nem sinal.

Ao contrário de Boogie, Inodoro Pereira é um homem rural. Fala, se veste, age e reage como narra com o folclore dos personagens do interior. Conversando com quem quer que seja. Nada teme e nada o desconcerta. E, mesmo com tantas palavras na ponta da língua, tem vezes que nos premia com uma filosofia. E, verdade seja dita: Pereyra é sobretudo um falante. Mora em um rancho, numa Argentina distante de sua Buenos Aires.

Entre uma tira ou outra, descobrimos que sabe domar cavalos, usar boleadeiras, que conhece os passos da dança chacarera. E vemos cuias, alpargatas, itens e personagens de sua vida campeira. Inodoro tem um nariz grande, um cabelo volumoso. E a largura das calças contrastam com o do seu peito, anda que anda folgado. Ao ficar fora de si, os dentes se mostram nitidamente, quadrados, a descoberto dos lábios. Voam perdigotos. Mesmo assim, consegue manter diálogo com os tipos mais estranhos.


É uma delícia ler o modo que Inodoro fala. Frases tomadas de regionalismo. No começo, eu tive dificuldades em me adaptar com a sua prosa. Avançando pelas 120 páginas do sua coletânea, ganhei experiência para sacar do que se tratava. Perceber que “güen” é “bueno” que “ubicaú” é “ubicado”, “nomaj” em vez de “no más”. Ou um “tata Dios” para manifestar sua crença e “Güenosaires” para citar uma referência administrativa. Um pouco arriscado demais para meu portunhol.

O modi di falá desse gaúcho argentino se explora explorado em companhias inusitadas. Fala com assombração, papai noel, cachorro, papagaio e até Antonio das Mortes – o personagem de Glauber Rocha. E personagens não menos verossímeis – índios, homens da lei, padres, sapateiros, payadores, palhaços e gringos.

As conversas entre Inodoro e os índios me fizeram pensar em Papa-Capim. Ou melhor, na representação dos índios em nossos quadrinhos. E foi um barato ver conversas divertidas entre esses habitantes dos pampas, porque ali aquele sempre se surpreende com as idéias e interesses dos nativos. Há um evidente choque cultural entre eles. Numa feita, a grande vontade era ir derrubar o governo em Buenos Aires, retomar a posse das terras por completo.

Desfila um personagem novo a cada enredo. Há um quê de Monteiro Lobato em Fontanarrosa. Pois tudo acontece com esse estancieiro, convivendo juntos o real e o fantástico. Inodoro difere muito de Pedrinho [personagem de Monteiro Lobato. Veja link anterior] em termos de aventura. Está longe de ser moleque, de sair correndo e aprontando. Esforço físico é só mostrar sua superioridade em um desafio qualquer. O mundo que venha até o rancho. Todos os mundos.


[FONTANARROSA. Inodoro Pereyra: número 15. Buenos Aires: Ediciones de la Flor, 1991 (1. ed.), 1996 (4.ed.). ISBN: 950-515-671-5]

Os livros do sebo

A primeira coletânea de Inodoro que eu tomei contato era a de número 15, intermediária entre os outros volumes de número 1 e 21, integrantes do pacote. O quarto elemento era um “Clásicos según Fontanarrosa”. Confesso que este último foi o responsável pela minha aquisição. Como um humorista colocaria Moby Dick em quadrinhos era charada boa de ver resolvida. E Inodoro veio de galope da baleia, Otelo e Homero.

- Como vai Inodoro?

- Mal, mas acostumado.

Impulsivo e temperamental. Se conversa com um biólogo gabaritado como Darwin e não conhece as palavras, ouve alguma de seu cotidiano que tenha o som mais parecido. Logo, um “gliptodonte” vira uma questão “si senti um grito dónde?”. E a conversa se emenda. Ou quase. Durante as primeiras leituras eu fiz uma associação com o Radicci, do Iotti. Talvez por uns modos grosseiros, pelo jeito de falar típico e até por um jeito de se vestir com as roupas de sempre. Ou por viverem em casas sem luxo e terem esposas que uma hora ou outra não agüentam seus disparates e lhes atiram algo em cima. Avançando as páginas, ficando mais familiar de Pereyra (olha a intimidade!), a imagem foi se desfazendo. Fontanarrosa nos conquista com uma força de raro poder. Quatro páginas com quatro tiras cada uma são suficientes para destilar um suco de psicologia, filosofia, história e malandragem. Original demais para minha capacidade de associação.

Para um homem do campo, falar com animais não é nenhum mistério. Não bastasse ter como maior interlocutor o seu cão, Mendieta, fala com o que estiver ao alcance. Bom para nós que achamos o absurdo elemento básico de sobrevivência. Aliás, um novilho fica muito mais simpático falando. E tem seus motivos para discutir e chorar. O animal recusa tomar sua vacina, prefere contrair aftosa pois assim não serve para o frigorífico. E bye, bye, exportação de carnes para o Mercado Comum Europeu.

A evolução do traço

Há uma diferença muito grande entre o primeiro Inodoro e aquele mais recente. O traço era mais forte, pesado, com mais áreas negras. Depois, em vez de preenchimentos, Inodoro passa a virar contorno. E para quem atravessa como estrangeiro o território de Inodoro pode pensar que são no máximo primos de segundo grau. O tamanho dos exemplares, as cores e tipos do título nos socorrem e deixam explícito: trata-se do mesmo homem. E do mesmo cão.

Mendieta, o parceiro fiel do protagonista desde os anos 1970. Se não falarmos desse “can hispanohablante”, ele mesmo se apresenta. E como sobra pouco tempo para a cortina se fechar e terminar este ato, tomemos a palavra e a cena de “Encuentro con el Gran Zigfield”. Mendieta deixa clara sua posição: não vai se se juntar ao circo. Quer terminar antes o curso de Medicina. Abandonados pelo pretendente, o dono chamou o mascote à verdade. E teve sua resposta:

- En verdá, don Inodoro, sucede que me yamó el Mario Vargas Llosa pa hacer en teatro "La ciudá y los perros".

(muda de quadro, close em Inodoro)

- Y usté hace de perro, Mendieta

(muda de quadro, plano aberto)

- Y... pa hacé de ciudá no me da el cuero don Inodoro.

PARA SABER MAIS: Sítio oficial de Fontanarrosa

sexta-feira, maio 16, 2008

O quadrinista (alemão) ao lado

Quinta-feira passada, 8 de maio, Diogo Cesar e Pablo Mayer estiveram em Porto Alegre, RS, lançando o livro de quadrinhos "A casa ao lado".



Detalhes sobre o trabalho você encontra cutucando nos links que pus nos nomes dos autores, acima da capa do livro. Esses links vão dar nos respectivos sites, com todas as informações que você precisa.

Por ora, não vamos falar da obra.

O lançamento foi no GibiBar. Estive lá e pude conversar um pouco com o Pablo e o Diogo. Na teoria, o primeiro fez os desenhos, e o segundo (que também é desenhista) fez o roteiro. Na prática, um deu pitaco no trabalho do outro, e a idéia inicial do roteiro foi do Pablo. O Diogo pôs em prática.

Na semana passada os dois estavam numa maratona para o lançamento do livro em várias cidades. Tudo foi meio em cima da hora. Contando com verba da lei municipal de incentivo à cultura de Joinville, SC, os dois conseguiram uma editora - a HQ Maniacs - para publicar o livro. Fora isso, tudo foi feito por conta deles. Pablo, 21 anos, e Diogo, 27, conseguiram por méritos próprios fazer uma obra primorosa. O capricho visual, o papel em que foi publicado, o cheiro de livro bem feito... (é cheiro de papel couchée, claro, mas, somado à qualidade dos outros elementos, esse cheiro adquire outro sentido: o de um trabalho realmente profissional, igual a esses livros que você encontra em grandes livrarias).

Enfim, realmente um ótimo trabalho, fruto da boa organização e talento da dupla, que culminou numa bela obra, dessas que dá vontade de abrir e começar a ler imediatamente.

Por conhecer o trabalho do Pablo de outra época (em 2006, fiz um post sobre o trabalho dele, seguido de mais outro), embora apenas interneticamente, dei uma atenção especial à leitura do livro. Devo dizer que inclusive criei uma grande expectativa. Só para explicar que não foi apenas uma folheada que me motivou a escrever este post.

Sobre o livro
Enfim, após a leitura, observei algumas coisas que, a despeito da admiração que tenho pelo trabalho do Pablo e do capricho em que esse se concretizou na parceria com o Diogo, não posso deixar de citar. Falo de problemas na narrativa interna da obra. Espero que os autores não se chateiem nem se sintam diminuídos. Trata-se de uma crítica que, suponho, vem a acrescentar. Do contrário, se eu ficasse omisso e não falasse nada, aí sim estaria menosprezando o trabalho deles.

Bem, estou enrolando porque realmente não sei como este post será recebido. Mas chega, lá vai:

* "A casa ao lado" conta a história de um cara recém-separado que se muda para a casa em que cresceu. A tal "casa ao lado" é uma mansão mal-assombrada, no terreno vizinho. De vez em quando levanta uma neblina no quintal da mansão e acontecem coisas estranhas. O filho do protagonista é um dos que some nessa neblina, e esse conflito desencadeia a história. Enfim, o resumo do resumo. Mais do que isso é melhor você mesmo ler. O que quero marcar aqui é que é um enredo bem menos especial que o capricho dado à parte gráfica. É uma história que diz pouco sobre a vida, sobre o comportamento humano, sobre algo difícil de compreender e que a obra poderia iluminar. Naturalmente, existem obras e leitores para todos os gostos. Ainda assim, obras classificadas apenas como gênero "humor" ou "aventura" ou "suspense" ou "terror" podem ser ricas o suficiente para nos entreter e nos fazer pensar, ao mesmo tempo. Mas bem, é uma questão de gosto, muito provavelmente eu não seja público-alvo do livro. Embora eu seria de muito bom grado se, logo no início, quando o protagonista é acordado sábado de manhã pela vizinha tocando a companhia e a cena mostra um quarto jogado às traças, a história tivesse seguido esse estilo meio gonzo.

* O comentário que acabei de fazer pode ser interpretado como mera opinião. Ou melhor, deve. Agora, quanto aos problemas narrativos do livro, aí já é uma questão de falta de maturidade no domínio da linguagem. As informações importantes (ou não) à narrativa de "A casa ao lado" estão concentradas demasiadamente nos diálogos. Isso é questão de amadurecimento no trabalho com narrativas maiores. Como no meio da criação de um roteiro vão surgindo amarras para aparar e problemas para resolver, a solução mais à mão é ir acrescentando as saídas às falas das personagens. O problema é que o diálogo em uma narrativa têm funções muito mais específicas do que resolver esquecimentos narrativos. O diálogo apresenta personagens, cria climas e tensões, revela (pelas entrelinhas) o âmago de quem está falando. O bom diálogo, claro. Pôr informações nos diálogos é aproveitá-los mal. E, pior, tira a naturalidade da narrativa. Obviamente é algo difícil de ser dominado (eu mesmo não domino um diálogo na vida real. Ehehehe). Vale o toque.

* Explicando melhor, uma boa narrativa deve deixar espaço para a inteligência do leitor trabalhar. De modo que o que é óbvio não precisa ser dito, o leitor conclui imediatamente pelo encadeamento dos fatos. Por outro lado, há narrativas que exigem demais do leitor, e ele não consegue ir adiante com fluência. Digamos que encontrar o caminho do meio é o grande desafio. "A casa ao lado" não encontra esse caminho, o que não é problema em se tratando de autores tão jovens. Eles certamente podem estar na direção certa, se amadurecerem com os erros desse trabalho.

* Os desenhos. Realmente muito bons, mas falta a noção do "mínimo essencial". Ou seja, o desenho deve mostrar aquilo que é importante à narrativa e descartar o resto. Desenhos muito detalhados criam uma espécie de poluição visual. O leitor se pergunta: "peraí, em que parte da imagem eu devo prestar atenção? Será que há algum detalhe importante que não percebi, algo que fará falta para entender a história depois?" Mesmo que ele não se pergunte isso conscientemente, o ritmo da sua leitura será prejudicada pelo excesso de informações que ele recebe dos desenhos. Assim como comentei em relação aos aspectos da narrativa, o desenho também tem que correr atrás do caminho do meio. O autor deve se perguntar: "o que eu devo retratar aqui que, se eu não o fizer, deixarei de estar prestando uma informação fundamental ao leitor? O que eu posso descartar? Como ser eficiente na produção dos sentidos específicos que quero provocar?" Claro que há estilos de quadrinhos que prezam o detalhismo, mesmo em autores consagrados. No fim, podem dizer que é uma questão de filiação a uma escola. Mas digamos que se os autores estiverem em busca de um dia ter o domínio da narrativa envolvendo texto e imagens, devem atentar para essa questão do "mínimo essencial", tanto do texto e do desenho, quanto do encadeamento dos dois. Em suma, a narrativa tem que ser clara para dar espaço ao que é realmente importante aparecer expontaneamente (o humor inteligente, a emoção, a identificação, etc). E uma narrativa é clara quando não é pormenarizada e também quando não é cifrada demais.

Pablo Mayer e Mawil
Fazer comparações não é muito legal. Não mesmo. Mas, neste caso, creio vir a acrescentar.

Em janeiro deste ano, escrevi aqui neste blog sobre o quadrinista alemão Mawil. Cutuque aqui (abra em outra janela) para reler. O Mawil tem um trabalho fabuloso, tanto na questão narrativa (algumas soluções que ele usa são grandes sacadas) quanto nos temas que aborda.

Pois bem, eu já havia observado, e um amigo a quem mostrei o "A casa do lado" (e que já tinha, pela minha esfusiante propaganda, ouvido falar do trabalho do Mawil) disse o mesmo: Pablo Mayer tem um estilo muito parecido ao do quadrinista alemão. Não iguais, claro, que cada um tem o seu. Mas olhar o trabalho de um faz lembrar o trabalho do outro. Como tenho certeza que os dois não se conhecem, posso afirmar: são dois grandes talentos surgidos espontaneamente. E com estilos que, particularmente, me agradam muito.

No caso do Mawil, no post em que falei dele já disse tudo o que queria dizer (tive acesso a outro trabalho depois, também muito bom, mas não citei aqui porque o principal já estava dito). No caso do Pablo: os desenhos são de um vigor e de um estilo impressionante. É realmente curioso que um artista tão novo já tenha encontrado o seu jeito particular de se expressar. E uma expressão de alta qualidade, ainda por cima. Há maturidade de estilo.

Bem, Mawil tem isso e ainda algo que é a única coisa capaz de sustentar uma narrativa e um trabalho que perdure no tempo e no espaço: tem estilo e vigor também no aspecto narrativo, criatividade na hora de ter soluções novas ao narrar (sempre usadas com eficácia de produção de sentidos, claro, não pelo mero experimentalismo) e boas histórias para contar. Histórias que emocionam, que nos fazem pensar na vida, aprender sobre ela.

Digamos que, se o Pablo enveredar pelo caminho do Mawil, vai estar no caminho certo.

Quer dizer, não há um só caminho. E quem sou eu para induzir alguém a produzir algo que eu goste de ler? Enfim, esse intercâmbio pode ser útil mesmo num outro caminho que se queira seguir.

***

Epílogo:
Um blogueiro ranzinza
Sim, sim, já notei que ando ranzinza e rigoroso em alguns julgamentos que faço neste blog. Não pense que não me questiono: "tá, isso é rigidez na minha avaliação? Ou realmente o que eu apontei merecia ser apontado?" Esse autoquestionamento é constante.

No fim, acredito que esse ranço e essa ranzinzice é algo que surge naturalmente, à medida que se começa a ter acessos a grandes obras no formato quadrinhos. Quem lê Mawil, quem lê "Maus", quem lê Scott McCloud, quem lê os trabalhos publicados na revista Graffiti realmente fica mal/bem acostumado, já que aprende a saber tudo de magnífico e profundo que pode surgir da junção de texto e imagem, aprende a conhecer as grandes possibilidades e potencialidades de se trabalhar com quadrinhos. As exigências, portanto, passam a ser outras, maiores.

Associar quadrinhos a super-heróis e histórias para crianças, por mais que haja bastante mérito nisso, não é minha praia. E acredito que você, que lê este humilde blog, também está procurando outras coisas, fora do mamão com açúcar de sempre de quem fala de maneira rasa sobre quadrinhos.

...

...

...

Estou certo?

terça-feira, maio 13, 2008

Dica de sapo

Ricardo S. Tayra, do blog Sapos Voadores (e do Itaú Cultural), deu boas dicas para se fazer roteiros de quadrinhos. Veja cutucando aqui!

sexta-feira, maio 09, 2008

Gibi em conserva

A blogueira Elisa Kerr fez um post falando sobre o modo correto de conservar livros. Cutuque aqui!

Muitos quadrinhos têm formato de livros, mas a Elisa fez uma postagem especial só para os colecionadores de gibis e revistas. Cutuque aqui!

quarta-feira, maio 07, 2008

Historietas

Flash-back neste humilde blog!

Resgato aqui dois posts relativamente antigos, falando sobre quadrinhos argentinos. Este aqui e mais este.

(Ah, sim, tem este aqui também! Tinha esquecido...)

(Putz, tem ainda outro! Ainda bem que a profissão de jornalista tem insalubridade. Minha memória já está sendo afetada...)

Faço isso como gancho para divulgar dois blogs que contam com minha humilde recomendação:

* Historieteca - do companheiro Marcelo Pulido.

* Historietas Reales - que começou como um espaço para quadrinhos biográficos mas que, pelo que meu parco portunhol deduziu, já não é mais.

segunda-feira, maio 05, 2008

Botando a banca

Divulgo aqui um novo programa de tevê sobre HQ. O "Banca de Quadrinhos" foi criado em novembro do ano passado, mas só agora fiquei sabendo.

Para assistir aos programas na internet, cutuque aqui!

Eu só gostaria de entender por que toda pessoa que pensa em criar um programa de tevê sobre quadrinhos não consegue se desvincular do estilo adolescente de editar o áudio e o vídeo. Rockzinho de fundo, câmera inclinando e desinclinando, perguntas óbvias, apresentador que gesticula como se fosse rapper... (estou criticando programas desse tipo em geral, pois nem todos esses elementos estão presentes no Banca - não estão presentes, mas foram trocados por outros, alguns muito piores).

Está certo, quadrinhos remetem sim à infância e à adolescência, por mais que os velhos adoradores de quadrinhos tentem adultizar o campo. Remetem sim, mas não precisam remeter.

Está para nascer o dia em que muito contentemente divulgarei aqui um programa sobre quadrinhos estilo National Geographic. Por que não? Um programa em formato de tevê que fale sobre Jornalismo em Quadrinhos (Joe Sacco!), biografias (Marjane Satrapi!), livros de memórias (Art Spiegelman!) ou mesmo quadrinhos de super-herói e quadrinhos infantis de maneira séria, aprofundada. Propondo questões, discutindo o campo, associando quadrinhos a outras áreas de conhecimento, trazendo coisas realmente novas... Sem deixar de ter uma edição interessante.

Conteúdo para isso, já há de monte. Falta é alguém para tratar esse conteúdo à devida altura.

Tudo bem, tudo bem, logo vão me perguntar: "por que tu mesmo não faz, se te julgas capaz?"

Pois não me julgo. No máximo, tentaria. Apesar de que uma boa intenção já faria uma diferença enorme...

Bem, fica a bola quicando.

Sereníssimo

É outono e faz frio em Porto Alegre. As pessoas se aproximam para manter seus corpos aquecidos. Mas não só isso. É uma aproximação sentimental, emocional, nostálgica. Filosófica! Uma aproximação que faz pensar na vida.

Em suma, um clima perfeito para ressoar em nós as letras das músicas de Renato Russo. Como esta:

"Há Tempos" - Legião Urbana

Composição: Dado Villa-Lobos/Renato Russo/Marcelo Bonfá

Parece cocaína
Mas é só tristeza
Talvez tua cidade
Muitos temores nascem
Do cansaço e da solidão
Descompasso, desperdício
Herdeiros são agora
Da virtude que perdemos...

Há tempos tive um sonho
Não me lembro, não me lembro...

Tua tristeza é tão exata
E hoje o dia é tão bonito
Já estamos acostumados
A não termos mais nem isso...

Os sonhos vêm e os sonhos vão
E o resto é imperfeito...

Dissestes que se tua voz
Tivesse força igual
À imensa dor que sentes
Teu grito acordaria
Não só a tua casa
Mas a vizinhança inteira...

E há tempos
Nem os santos têm ao certo
A medida da maldade
E há tempos são os jovens
Que adoecem
E há tempos
O encanto está ausente
E há ferrugem nos sorrisos
Só o acaso estende os braços
A quem procura
Abrigo e proteção...

Meu amor!
Disciplina é liberdade
Compaixão é fortaleza
Ter bondade é ter coragem (Ela disse)
Lá em casa tem um poço
Mas a água é muito limpa...

Tem também este verso, muito simbólico:

Consegui meu equilíbrio cortejando a insanidade
("Sereníssima" - Legião Urbana. Composição: Dado Villa-Lobos / Renato Russo / Marcelo Bonfá)

Procurei na internet alguma ligação entre "quadrinhos" e "Renato Russo" que justicasse este post. Achei esta notícia e esta homenagem. Mas, é óbvio, este post surge do sentimentalismo mesmo...

Ou seria do frio?

Enfim, é isso.